sábado, 16 de outubro de 2010

A Ética do Desatino e o Escâdalo da Animalidade

“E o louco, percorrendo até o furor da animalidade a curva da degradação humana, desvenda esse fundo de desatino que ameaça o homem e que envolve, de há muito, todas as formas de sua existência natural” (p. 159).

A discussão sobre a questão da animalidade foi essencial no texto, e podemos trazê-la para várias áreas de nosso percurso de estudos psicológicos e filosóficos. O texto Animots: um exercício de leitura dos animais, de Eduardo Jorge, faz uma reflexão um tanto poética acerca do trabalho de Jacques Derrida, chamado O animal que logo sou, discorrendo sobre a animalidade sob diversos pontos de vistas. É essencial para nós, que aos poucos construímos nosso blog, pois faz justamente contrapontos com A história da loucura de Michel Foucault, na Idade Clássica até a contemporaneidade.

A seguir, destacarei alguns dos pontos principais desta leitura. Façam bom proveito!

Derrida nos pede para renunciar ao saber, saber esquecer o saber. Renunciar ao saber: existe algo que nos aproxime mais do animal? E aqui é interessante pensar na desarticulação de um discurso que torna o homem animal.

Michel Foucault na História da loucura trata bem desta questão do louco, este Outro vivendo como um animal. Assim, a relação entre asilos e zoológicos tem um desígnio carcerário comum para encerrar ali uma animalidade.

“A animalidade na idade clássica perdeu seu indício de além da vida medieval e agora figura-se como a loucura do homem encerrando ele em si mesmo em um estado natural. Nas palavras de Foucault, a animalidade despoja o que há de humano no homem, chegando a estabelecê-lo no grau zero de sua própria natureza. Mesmo assim, essa animalidade chegava a protegê-lo contra o que poderia existir de frágil, precário e doentio no e do próprio homem (...).”

“Com uma desconfiança diante da linguagem e de sua pseudo-evidência, que o homem chama de seu mundo, seu saber, sua história e sua técnica, que Derrida afronta os sinais prévios dessa relação homem-animal: o animal (alogon) se encontra, segundo Heidegger, privado de acesso, em sua abertura mesma, ao ser do ente enquanto tal, ao ser tal, ao “enquanto tal” do que é. A tristeza, o luto, a melancolia da natureza ou da animalidade nasceriam assim, segundo Benjamin, desse mutismo, é certo, mas também, por isso mesmo, deste ferimento sem nome: ter recebido o nome. Ao se encontrar privado de linguagem, perde-se o poder de nomear, de se nomear, em verdade de responder em seu nome. (Como se o homem não recebesse também seu nome e seus nomes!).

“Segundo Derrida: ‘Animais selvagens. Com respeito aos animais selvagens, os sentimentos equívocos dos seres humanos talvez sejam mais irrisórios do que em qualquer outro caso. Há a dignidade humana (na aparência, acima de qualquer suspeita) mas não será preciso irmos ao jardim zoológico: por exemplo, quando os animais vêem surgir a multidão de criancinhas seguidas por papás-homens e mamãs-mulheres. Apesar das aparências, o hábito não consegue impedir um homem de saber que mente como um cão quando fala de dignidade humana no meio dos animais. Porque em presença de seres ilegais e profundamente livres (os únicos verdadeiramente outlaws), a mais equívoca das invejas ainda leva a melhor sobre uma estúpida sensação de superioridade prática (inveja que se manifesta nos selvagens sob a forma de totem que se dissimula, de um modo cômico, nos chapéus com penas das nossas avós de família). Com tantos animais no mundo só perdemos isto: a inocente crueldade, a monstruosidade opaca dos olhos que mal se diferencia de pequenas bolhas formadas à superfície da lama, o horror ligado à vida como uma árvore à luz. Restam os gabinetes, os bilhetes de identidade, uma vida de criados biliosos e, no entanto, sei lá que estridente loucura chega a parecer-se, durante certos desatinos, com a metamorfose’.

Obs: Pode ser encontrado no seguinte link: http://www.letras.ufmg.br/poslit/08_publicacoes_pgs/Em%20Tese%2014/TEXTO%2011.pdf

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